sábado, 5 de maio de 2012

Clarissa.

    
    Ela gostava de si mesma. Talvez não como outras meninas - que costumam idolatrar a si próprias - o faziam, mas ela tinha um enorme orgulho de ser quem era. Orgulho esse cultivado após sobreviver a vários traumas que a deixaram incapacitada, desasada, com vontade de sumir.
Clarissa era assim: uma menina leve que poderia facilmente passar despercebida pela multidão (coisa que ela tentava ao se esconder em enormes moletons e cachecóis bregas); poderia sim, se não fosse por aqueles olhos que exprimiam sempre algo muito profundo, algo de saudoso, algo de melancolia, algo de dor. Aqueles olhos com que ela enxergava o mundo não eram os mesmos com que ela enxergava a si própria. Clarissa se via como uma menina desajeitada, fraca, um pouco esperta talvez, mas desatenta demais para coisas práticas. Se via como se veem os artistas de circo, como uma pequena equilibrista de nariz rosado e mãos pequenas.

Qualquer um que visse Clarissa percebia na hora que ela - apesar do sorriso meia-lua que costumava estar estampado em seu rosto, indicando um desejo de felicidade, um esforço de ajuste - não era uma menina comum. Ela se esforçava, é claro, para desaparecer. Desaparecer, apenas isso. Coisa que - infelizmente - não conseguia. Seus olhos revelavam sua dor, sua intensidade, e mesmo quando ela sorria havia algo nela que fazia com que seus grandes olhos - dotados de um verde amazônico - marejassem, se tornassem rasos d'água e se perdessem em pensamentos, coisa que a frustrava por demasia.

Suas mãos delicadas e finas logo tratavam de enxugar qualquer resquício de lágrima que pudesse haver, e fazia questão de dizer: "são apenas lágrimas da rinite, nada de mais, não se preocupem", mas a verdade é que havia muito com o que se preocupar, mas ela não suportaria ser tratada com piedade ou até mesmo ser um fardo de preocupações para outras pessoas. Assim, se escondendo sempre em algum cachecol brega e em um moletom desbotado, Clarissa continuava a caminhar. Sua dor ela escondia o máximo que pudesse, mas infelizmente seus olhos sempre deixariam algo de melancólico na atmosfera, mesmo que seu sorriso de meia-lua fosse o mais radiante do local.


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