quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Desista, veja as estrelas.



Sua cabeça pesava por tanto sonhar. Imersa em um mundo onde seu coração era o dono da verdade, perdia sempre a hora, o ponto em que devia descer, a matéria da aula que assistia, o segredo que lhe era contado no ouvido, a oportunidade. Seu universo idealizado era tão incrível que o mesmo supria todas suas necessidades, consolava-a a cada desgosto, enchia-a de esperança a cada lágrima que perigasse cair, fazendo com que ela não precisasse viver o que o mundo ao seu redor lhe oferecia. Pouco. Pra quem se fez em sonhos, não há realidade que realize. 
 Olhando pra dentro de si, via seus olhos como estrelas e sua boca a cuspir margaridas. Mal sabia como era por fora, não precisava.
 Cresceu e, aos poucos, foi tirada de seu mundo e jogada na rua, em meios a outros sonhos despedaçados. Não sabia como viver, mas viveu. Mesmo que no automático. Uma sessão de choro por noite, por motivos variados: não saber lidar, não saber amar, não saber reagir, disfarçar, roubar, enganar, sorrir...sonhar. Não sabia mais fazer nem o que passou anos se especializando. 
 Até que um dia, exausta do universo onde era leiga de tudo, desistiu dele. Já era a quarta vez no mês que seu chefe a chamava pra discutir seus erros. Ela não havia nascido pra aquele mundo. Subiu ao terraço do prédio em que trabalhava e caminhou lentamente até o muro. Ali, à beira do abismo, resolveu olhar pra cima. Há quanto tempo Laura não fazia aquilo? Costume de quem não tem mais o que fazer. O céu é mesmo pra poucos. É pros que respiram. Pros que param, pausam, desistem de vez em quando. O céu é pros que desistem. Ela era uma desistente. Quando sonhava e viajava entre as estrelas (as mesmas que estavam acesas no céu aquela noite), há muitos anos atrás, não sabia, mas estava fugindo e desistindo do que chamamos de "real". Tanto faz. Ela só queria aquela sensação de novo. Afinal, o que a fazia feliz era não viver. 

Adeus, realidade. [...] Boa noite, estrelas! Voltei. Serei sua pra sempre. 

E um clarão (provavelmente efeito da aproximação de tantos corpos celestes) invadiu sua alma, seu coração. Sua felicidade só era real no mundo em que imaginava.

Um comentário:

  1. Alice, como assim, seus textos são muito incríveis! Enquanto eu leio, começo a imaginar coisas, ilustrar as palavras na minha mente. E a conclusão, o final, é lindo!

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